Apesar da pressão e da compra de votos, governo não consegue aprvar Reforma Administrativa
Por: Vanessa Galassi, CUT-DF
Ficou para 2022 a votação da PEC 32, da reforma administrativa, pelo plenário da Câmara dos Deputados. O cenário é comemorado pelos servidores públicos de todo país, que realizaram manifestações durante 14 semanas para barrar a proposta que destrói os serviços públicos. Entretanto, lideranças de entidades sindicais que representam o funcionalismo público, entre elas a Confederação dos Trabalhadores no Serviço Público Municipal (Confetam/CUT), e parlamentares que defendem um Estado forte reforçam que a mobilização contra a proposta de emenda à Constituição deve ser mantida.
“Sem dúvida nenhuma, a não votação da PEC 32 em 2021 foi a maior vitória dos servidores públicos neste ano. Mesmo com as limitações de acesso à Câmara, realizamos ações intensas em frente ao anexo II da Casa, marchas, atos, pressões no aeroporto de Brasília, atuação nas redes sociais”, avalia o presidente da CUT-DF, Rodrigo Rodrigues.
Segundo Rodrigues, embora a garantia da vitória em 2021, é imprescindível que se mantenha a mobilização dos diversos setores do funcionalismo para enterrar de vez a reforma administrativa em 2022. “O receio dos deputados em votara a PEC 32 é prova da perversidade dessa proposta. Se fosse um projeto bom para os servidores, bom para a população, não haveria, de forma alguma esse receio diante do ano eleitoral. Mas a pressão do empresariado para que a PEC 32 passe a valer é imensa, inclusive com o apoio dos empresários donos da mídia. Por isso, nada é definitivo, e a luta deve ser constante e cada vez mais forte”, avalia.
No último dia 10 de dezembro, em encontro com empresários, o ministro da Economia, Paulo Guedes, disse que a reforma administrativa não é um problema para o ano eleitoral, e que, ao contrário, pode atrair votos.
A fala do ministro que, a partir de movimentações financeiras em paraísos fiscais, lucrou cerca de R$ 14 milhões com a valorização do dólar frente à crise econômica no Brasil, é uma tentativa de descredibilizar o recado dado pelos servidores públicos aos parlamentares: se votar, não volta.
“Eu sei que é difícil o governo conseguir 308 votos em ano de eleição. Mas fiquemos atentos, pois o que querem, com essa política ultraliberal, é justamente fazer a privatização de empresas públicas e de serviços públicos brasileiros e, com isso, afetar também os direitos dos servidores, com o término do plano de carreira, do concurso; passar a ter contratação temporária, corte de jornada e salário. A maldade é muito grande”, alerta coordenador da Frente Parlamentar Mista do Serviço Público, deputado Rogério Correia (PT-MG). “Vamos levantar a #PEC32NuncaMais para que ela não volte em ano de eleição. PEC 32 nunca mais, Bolsonaro nunca mais”, diz o parlamentar em vídeo divulgado pela Frente.
“Não vamos dar sossego a esses que querem roubar nossos direitos e aniquilar com os serviços públicos. A mobilização surtiu efeito e vamos estar na cola dos parlamentares. O recado aos deputados continua sendo um só: votou PEC 32, não volta”, afirma o secretário-geral da Condsef/Fenadsef, Sérgio Ronaldo da Silva.
Mais do mesmo
Em setembro, a Comissão Especial da Reforma Administrativa aprovou o substitutivo do relator deputado Arthur Oliveira Maia (DEM-BA) à PEC 32. Para garantir a aprovação, Maia apresentou sete textos substitutivos e trocou oito parlamentares titulares antes de votar o substitutivo, que, no fim das contas, seguiu agradando os interesses do governo.
Entre os pontos negativos mantidos no substitutivo da PEC 32 está a manutenção dos instrumentos de cooperação entre o governo federal, estadual ou distrital com entidades privadas para gestão dos equipamentos públicos, como escolas e hospitais.
“Hoje, uma escola, por exemplo, com servidor estável, com concurso público, já tem dificuldades em garantir educação. Imagine em um modelo com políticos podendo indicar quem vai ser contratado nessas entidades”, analisa o advogado Marcos Rogério, especialista em direitos dos servidores públicos, em entrevista para o Sindicato dos Professores do DF (Sinpro-DF).
Ao mesmo tempo em que o substitutivo manteve a estabilidade para todos os servidores concursados (e não só os de cargos típicos de Estado), o texto do deputado Arthur Maia impôs as contratações temporárias por até dez anos, reduzida anteriormente para seis anos. No substitutivo, Maia alarga esse tipo de contratação, viabilizando-a em todas as áreas públicas que não forem as de função típicas de Estado. Segundo o advogado Marcos Rogério, isso impacta na estabilidade dos servidores.
“Ao permitir que os contratos temporários sejam utilizados ao bel-prazer, ele (Arthur Maia) alarga demasiadamente este conceito e, de forma sub-reptícia, quebra estabilidade (dos servidores)”, explica. A estabilidade não está garantida para empregados de empresas públicas e sociedades de economia mista, como Caixa Econômica Federal e Petrobrás.
Além disso, o texto do relator ainda traz a possibilidade de corte de jornada e salário em até 25%. Corte de benefícios como licença-prêmio, mais de 30 dias/ano de férias e aumentos por tempo de serviço também serão cortados, além de facilitada a abertura de processos administrativos para perda de cargo de servidores com avaliação de desempenho insatisfatório.
Antidemocrático
A mídia comercial vem sendo um dos principais pilares para a aprovação de propostas do governo federal que mudam a estrutura do Estado. Foi assim com a reforma da Previdência e, agora, a atuação antidemocrática se repete com a reforma administrativa.
Em agosto do ano passado, foi dedicado um bloco inteiro do Jornal Nacional à reforma administrativa. A matéria, de cerca de quatro minutos – um tempo preciosíssimo no horário nobre da TV aberta – criticava o gasto do governo com o salário de servidores públicos das três esferas, comparando os valores com investimentos em áreas do serviço público, como saúde e saneamento básico.
Basicamente, a matéria trouxe apenas uma fonte: o Instituto Millenium, uma espécie de think tank que faz lobby pela aprovação de reformas neoliberais, e que tem como acionistas membros da própria Rede Globo.
“Entre gráficos e números, a matéria colocava de um lado o investimento do governo nos setores do serviço público e, de outro, os salários dos servidores públicos, como se fossem robôs que executassem os serviços públicos. A gente precisa reforçar que serviços públicos de qualidade dependem de servidores públicos valorizados, o que não acontece hoje e ficará muito pior se a reforma administrativa for aprovada”, analisa a secretária de Comunicação da CUT-DF, Ana Paula Cusinato, servidora pública federal.
O apoio às reformas neoliberais não é uma exclusividade da Rede Globo. Outras empresas que detém o oligopólio da mídia, como Record, Bandeirantes e o Grupo Folha, também são trampolins para as propostas de redução do Estado. Todas essas empresas têm negócios em setores como educação, saúde e outros serviços prestados pelo setor público.